fevereiro 20, 2010

Mão dupla


Se queres que eu sangre,
que eu doa,
que eu agonize,
que eu me lance,
que eu levite,
dê gargalhadas,
que eu me encontre,
alcance as alturas,
que eu siga para saber,
e volte sabendo menos,
que me perca em cálculos,
e seja feliz por mim apenas,
que eu dance,
e sufoque,
que eu exploda,
e insista,
que me assuste,
sem chão,
sem norte,
tudo isso sobre um vivendo-e-morrendo intensamente,
dê-me um só segundo de mundo a dois...

Inspiração


nasci quando recriei a dor humana,
sou da intenção muda de certos caminhos,
não me vejo de outro instante senão do devir,
minha fotografia é uma frase avançando,
de onde emergem gritos e vazios profundos;
a ânsia com que vou é dos textos e da loucura,
sou filha do silêncio com contextos de atalho,
guardo alegrias sob o peso das exclamações,
trago entre pontos notícias tristes dos homens,
desço e subo atônita em intervalos de vírgula,
perco minha voz em dúvidas de reticências,
não tenho casa, sou de como segue a frase,
não tenho tema, vivo de sentidos e sons,
entro em parafuso no fim de cada estrofe
para atravessar o fundo branco que há em ser,
se há mais luz depois é quando sou desejo;

fui criada para exceder a intenção do eu lírico,
para nem ser eu mesma e nem assim o eu outro;
existindo de empréstimo de ideias e gêneros,
sou o que se escreve aqui e o que não se vê,
o que se inscreve por haver sido mel ou sangue,
estendo rios para que naveguem os amantes,
semeio horizontes para que sigam os errantes,
desenho planos de fuga, ânsias de fogo e fel,
estou num estado de entrelugar, de entresser,
com veredas que vão a várias possibilidades...
é assim que aconteço de vida em tudo e nada,
para depois dessa viagem de ocos e mundos,
retornar ao desvio onde deito as palavras,
e zelar pelo vão das janelas na última frase,
onde os verdes da alma começam a amadurecer...
com cuidado para que logo deitem as sementes,
que tudo meu morre e nasce de outras linhas,
a evitar sempre os abismos do ponto final.

Ricardo Fabião (Outubro - 2009)

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